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Posts Tagged ‘amor’

Ele a via chegar sempre como quem está atrasada. Ella. Esse nome era assim tão simples e categórico para o que Ella era. Ah, que mulher, ele suspirava. E chegava sem olhar para nada ou olhando tudo como se nada fosse interessante. E nada era depois que ela entrava. Muitos também deviam suspirar como ele “Ah, que mulher Ella…”.

byro_02Ele olhava do outro lado da sala ela adentrar, atento, com o coração quase na boca, pronto para dizer qualquer coisa como “vamos dar um passeio ou um chopp depois do expediente, quem sabe”, mas permanecia inerte. Ella pouco se interessaria no que ele diria porque gaguejaria e lhe suariam as mãos. Talvez a pressão baixasse, a asma surgisse e de supetão, ele puxaria a bombinha do bolso da camisa antes mesmo de dizer “oi”.

Ella usava sempre roupas pretas e entre um cafezinho e outro, na copa da empresa, ele já ouvira os outros dizerem que tinha um ar sinistro, que fumava e era monossilábica. Mas ah, que mulher misteriosa… Fazia surgir ciúme das outras funcionárias, tinha uma postura que era só sua. O jeito que abaixava para pegar um memorando que caia, a forma como apontava o lápis e divagava olhando para tela do computador. Ah, se ele pudesse…

Foi numa segunda-feira que se armou de coragem e decidiu: passaria e ultrapassaria o limite de Ella. Não poderia ser pior do que já era viver de vontade, imaginá-la fazendo coisas simples, como arrumar a casa ou prostrada por uma gripe. Enfim, coisas de gente apaixonada imaginar situações assim.

Enamorado pelo dia seguinte, dormiu agarrado no despertador e com o livro de Neruda longe da cama. O livro era velho e poderia lhe causar espirros por conta de uma alergia que bem conhecia desde a infância. Mulheres gostavam de poesia, de flores, de romantismo. Então, a conquistaria assim: com uma rosa a mão e um verso no ato. A Dança, de Pablo Neruda.

Adormeceu decorando a tal Dança:

– Te amo como a planta que não floresce e leva, leva… hum… dentro de mim. Não, droga. É dentro de si, dentro de si, seu estúpido, estúpido – repetia como autoflagelação.

E então respirava fundo, limpava a testa com um lencinho que estava sempre a tiracolo no bolso e retomava a sabatina de si mesmo:

– Te amo como a planta que não floresce e leva
dentro de si, oculta, a luz daquelas flores,
e graças a teu amor vive escuro em meu corpo
o apertado aroma que ascender da terra.

Foi então que ficou aliviado.

No dia seguinte, não conseguiu nem tomar café. Acordou com o estômago em brasa e um riso solto sem motivo. Até esqueceu-se da bombinha, do agasalho para caso o tempo esfriasse, da sua caneta da sorte que poderia ser tão importante naquele momento. O melhor momento de sua vida.

As tarefas mais corriqueiras pareciam ter um brilho diferente, pois ao final do dia ele teria sua recompensa. Todos os memorandos saíram com um ar de carta de amor e a Dança de Neruda bailava em sua cabeça. Ele permaneceu o dia todo rabiscando palavras soltas – flores, dentro de si, alma – nos cantos das folhas de papel.

Mais precisamente ás 17:25 h foi chamado para uma reunião. Um medo monstruoso o invadiu e fez com que sua úlcera mostrasse a seu corpo para que veio ao mundo. A dor era horrenda, mas pior ainda era a possibilidade de Ella sair da empresa antes que o tormento corporativo acabasse.

Não queria saber da crise que o país enfrentava – que vá para o inferno a crise – e que bla bla bla mais chato era ouvir tanto papo furado sobre contenção de despesas, corte na equipe por motivos maiores e que sentiam muito. Ah, martírio era amar tanto aquela mulher. Ah, que mulher… Saiu da sala sem entender nada sobre o que se passava e pouco se apercebeu quando a gerente do RH disse a ele para comparecer em sua sala para “acertar as contas”.

Saiu esbaforido da sala, suando feito um porco, óculos embaçado e a tal Dança sendo repetida bem baixinho:

– “Graças a teu amor vive escuro em meu corpo o apertado aroma que ascender da terra…”

Chegando a sala, nada de Ella. Ela havia ido embora, levado sua graça para outro lugar e ele, ali, perdido, com cólica, falta de ar, suadeira, pressão baixa e o tique nervoso, que tanto o atormentava, mais acentuado do que nunca. Até seus pensamentos gaguejavam. Tomado por uma fúria nunca antes conhecida pelo seu corpo e por sua alma, saiu da sala correndo.

Desceu pelas escadas para ser mais rápido e a cada lance, sentia-se irremediavelmente mais perto de sua amada. Ah, que mulher eu terei, pensava o apaixonado. Ah, que lindo será o destino que nos aguarda, Ella; dizia ele mentalmente.

Chegando ao hall do prédio, nenhum sinal dela. Avançou para a calçada e a avistou ao longe, de seu lado direito. Ella andando leve e displicente. Teve que parar durante cinco segundos para arrumar o rosto e recolocar os óculos no alto do nariz, empurrando com o dedo indicador. O cabelo também merecia um grau: cada uma das mãos era responsável por deslizar, da raiz até as pontas, sobre o penteado meticulosamente feito com gel e repartido para o lado esquerdo.

Andava apressadamente por entre as pessoas que não entendiam nada. Ainda assim, com toda pressa, ele muito educado, pedia licença e perdão a cada esbarrada que dava. Viu-a atravessar a rua e gritou desesperado:

– Eeeeeeeeellaaaaaaaaaaaa…

Num ímpeto de momento, enquanto ela já atingia a outra calçada, ele arvorou-se em direção ao asfalto. Um Corsa ano 2007, de cor preta, placa JT3852, com uma mulher ao volante, atropelou o pobre nerd que só então percebeu que a vagabunda gótica estava com fones de ouvido. Que caralho de puta autista era aquela que conseguia nem olhar pro lado enquanto andava? Merda. E ainda estava desempregado. Puta-que pariu. Essa vida é uma merda mesmo!

Fim.

Moral da história: o amor é uma piada onde quem ama, sempre se fode no final.

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Eu desafio qualquer receita barata antidepressão e meu mau humor. Não quero torná-los parte integrante do meu ser.  Desafio o que é imposto, o que é seguro o que é tido como bom, o supostamente Pré- estabelecido (por quem?). Desafio a rima, mesmo rimando em descompasso. Desafio a distância por ela ser tão grande quando quero afago e ínfima quando a suplico.foto3

Desafio você a me desafiar sem conseguir irritar-se. Tenho teimosia à flor da pele e nervos de açúcar ou de qualquer outra coisa que dê para “trocadilhar” com nervos de aço. Desafio a língua portuguesa, o acordo ortográfico – “abrupta” ou “ab-rupta” mudança? Ainda haverei sempre de parir neologismos bem ou mal criados.

Desafio essa vida que eu levo que não é inteiramente minha. Quero desafiar o medo que há em mim de ir além, de achar que certas coisas não me pertencem. Todas elas me pertencem. Todas podem me pertencer. Mas sem esse papo positivista – pós – modernista – motivacional de “querer é poder”. Não é. Isso eu sei. Mas eu quero muito e quero tanto, tanto.

Vou sair daqui, dessa cadeira, da sala fechada, para saber só de olhar pro céu se é dia ou noite. Vou esquecer o relógio e os meus dogmas. Não quero ser escrava. Quero ser ama do desejo, da vontade sublime de viver, de ondas do mar, sal de praia colando na pele.

Quero sentir teu sabor, misturado com tequila e chiclete de canela. Quero ficar com teu cheiro na palma da mão e ficar cheirando de pouquinho em pouquinho, assim, abafando as duas mãos, como se teu cheiro fosse só meu. Como se eu pudesse guardá-lo numa caixinha e levá-lo na bolsa pra onde quer que eu fosse. E assim, desafio a lógica de só querer o que é possível.

Fico derretendo meus neurônios e descobri que tenho vocação para isso: para derretê-los com textos que não saem até que eu esprema a última gota de enxaqueca, analgésicos, jornais, revistas e anuários. E eis que se dá uma avalanche de letras corroídas, palavras ulceradas e até enferrujadas por tanto uso. Que se dane o que já foi feito, pensado, falado e esperado. Quero mais é o estrago do desconhecido, o que está por vir.

Quero perder menos tempos em telas e ganhas mais em páginas. Quero lembrar que os Correios existem e esquecer do Gmail. Quero mais mentiras sinceras e menos raspas e restos. Não quero mais me contentar com restos.

Vou falar atrevidamente, mostrar interesse só para o que me interessa e pendurar na porta de casa uma placa com os seguintes dizeres: “EU NÃO ME IMPORTO”.  Seja lá o que quer que você tenha para me dizer, pense antes. Porque eu simplesmente, não me importo mais.

Vou usar menos salto alto e mais saia – sejam curtas, rodadas, pregueadas ou retas. O papo mesmo é pernas de fora, pra ver se inspiramos a vida a ficar de pernas pro ar. Minhas unhas serão carmim, meus óculos vermelhos e assim eu sairei do sótão em mim onde guardo meus pesares, meus maus presságios. Inovarei meu novo mundo à cor de sangue.

“Tudo novo de novo”.

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Um trecho

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(…)

Cada vez que me apertas contra teu peito, me sufocas e eu não consigo respirar. Cada vez que me apertas na palma da tua mão, como um punhado de areia, eu caio por entre as brechas aos poucos até que quando tu possas abrir só haja a sobra, só haja o um nada de areia que de nada te servirá. Um punhado que não serve nem para jogar em cima de um caixão antes da última despedida.

Eu ando tentando me consertar e abafar o que sou e ainda me entender no meio disso tudo. E com toda minha fraqueza posso te afirmar que não tem sido fácil e engulo toda dia uma pílula cujo único objetivo é fazer-me sentir bem. Mas continuo me sentindo vazia e tentando fazer com que isso passe num estalo de tempo, entre um cigarro e outro. Sem muito sucesso, confesso.

(…)

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Meu maior medo é te ver partir. Maior de idade e de malas prontas na porta de nossa casa, dizendo “tchau, velha” e eu consentindo tudo isso. Meu bebê largando a barra da minha saia e me chamando de velha. Meu maior medo logo depois será tornar-me velharia em tua vida.

Mas sei que vou superar esse medo e substituí-lo por outro, o medo de que não estejas tongspbcomendo bem, limpando as orelhas direitinho, separando a roupa colorida da roupa branca na hora de lavar e me preocuparei se usas camisinha. De nada vai adiantar os gastos que tivemos com Johnson & Johnson, o truque que eu tinha para limpar tuas orelhas sem te fazer chorar e as roupinhas tão fofas e bem lavadas se entrares nessa brincadeira de roleta-russa que é transar sem camisinha hoje em dia. Não dá. Vou perder noites e noites de sono pensando se compras preservativo e de que marca.

Não tenho medo que engravides uma moça – eu disse “moça”? Tô ficando velha, meu Deus… – ainda novo. Vieste a minha vida como uma bênção e assim, tão de surpresa quanto um dia de sol com chuva. Foste presente planejado não por mim, mas por um plano maior, algo mais superior que esse sentimento que nutro por ti. Vieste mais para que eu aprenda do que para que eu ensine. Portanto, não temo pela gravidez na juventude.

Temo sim por milhões de coisas que quero que faças: as viagens de mochilão, de carona, à praia, com garotas, com amigos, com dinheiro, sem dinheiro, para fora do país, para o interior do Brasil. Receio por não viajares em si próprio por meio da leitura, das músicas, dos romances complicados, das terapias, das fotografias, das imagens belas e sujas que a vida, a vivência em si, nos fornece. Quero-te como uma esponja, absorvendo tudo que o mundo pode te oferecer.

Aí me vem o medo de que sejas tão cidadão do mundo que não voltes para o Natal, para o Círio, para a Páscoa, para o aniversário dos teus avós, para o meu aniversário. Tenho medo do que o mundo venha a te oferecer possa te afastar do que é teu por completo, que é o amor que todos nós dedicamos a ti desde que soubemos de tua vinda.

Se aquela revista para gestantes estava certa, ouviste direitinho quando li para ti O Pequeno Príncipe. Eu estava grávida de cinco meses e mexias e remexias na minha barriga. E quero que lembres da parte que diz que somos responsáveis por aquilo que cativamos. Sim, somos mesmo. Portanto, cative o bem. E só. O resto será automático, será conseqüência.

Um dia eu vou te ver grande e isso vai me doer, eu sei. Eu vou reclamar por nada e de tudo, porque me faltará assunto e também me faltará jeito para dizer o quanto te amo. Vou fazer piadinhas sem graça na frente das tuas namoradas e dos teus amigos porque vai me incomodar te ver me afastando do que é legal para ti. Disso eu também sei.

Mas me guarde sempre contigo, mantenha-me como um porto seguro. Desfaço todos os planos, tudo que puder eu faço, só para te ver feliz. Teu sorriso é luz branca, violeta e azul. Os meus olhos conseguem enxergar um arco-íris todo ao te ver e sentem da mesma forma. És o mais singelo significado de vida e força.

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Ela andava afoita pelo futuro. O presente não oferecia novidades, não a estimulava, nem com todas as mudanças dos últimos tempos: mudou do Sul para o Norte, mudou de faculdade, mudou o número do celular e naquele ímpeto de quem quer dar grandes reviravoltas, disse a si mesma que mudaria mais um pouco. Começou uma dieta, deixou o namorado e se jogou na vida bandida, decidiu a felicidade.

Mas aquela vontade de saber mais sobre o futuro a corroia. Porque era presa de alma. Não conseguia dar um passo a frente sem perguntar a dez mil pessoas antes o que deveria fazer e era inexoravelmente maniqueísta. Traçava seu plano maior se baseando no que os outros pensavam e no que era “certo”. E pelo andar da carruagem – porque naquela cabecinha de merda ainda existiam contos de fada com princesas da Disney, carruagens que chegavam à meia noite e amor eterno – tudo daria certo enquanto ela focasse seu viver na pseudo-certeza dos padrões pré-fabricados por outras pessoas.

Foi aí que decidiu cair no conto do vigário. Para saber algo (leia-se mentira ou sinônimos) sobre o futuro, pagava qualquer coisa. Foi num cara que jogava búzios e pagou R$50. E claro, de nada adiantou. Ela logo percebeu que uma criança de quatro anos de idade faria aquela leitura: quando os búzios caiam com a cavidade para cima, era “sim”. Quando era o inverso, a resposta era “não”. Ou seja, porra nenhuma sobre nada da merda de futuro que a aguardava. Depois de uma espera de horas a fio, saber que tudo que o cara mais fodasso no ramo da vidência em búzios conseguia ler sobre a sua vida era aquilo, deu mais raiva ainda.

Aí num impulso de extrema “inteligência”, daquelas inteligências de macaco amestrado para freak show, foi que chegou a Tia Maroca. Ah, que mal faria ir a ela? É apenas uma vidente-benzedeira. Nada demais por apenas R$25 a mais. Agora ia dar tudo certo.

Pensou várias vezes em ir embora, mas como esperar que alguém extremamente desesperado por saber se seu futuro será composto por uma grande paixão, um emprego multimilionário juntamente com um príncipe encantado que chegue num cavalo branco, seja sensato? Não há como.

Por isso, continuou remoendo seus sonhos impossíveis de hight society e esperou. Meia hora, uma hora inteira, uma hora e meia, duas horas … e finalmente, o fim da espera chegou depois de duas horas e meia de espera. Não tendo aproveitado nada de sua experiência anterior com o cara dos búzios, acreditou que aquela espera toda era um sinal de que a tal da Maroca era fogo na roupa, acertava tudo sobre tudo. Sentiu-se aliviada e pensou: “ – Agora vai.”

E foi. Só não sabia exatamente o que tinha sido. Ficou em dúvida se aquilo era piada ou pegadinha. Ela lavou a cara na pinga assim como a senhora carinhosamente ordenava – enquanto a chamava de “fia”. É tão mais aconchegante quando numa situação difícil, as mulheres deixam aflorar seu espírito maternal, não é mesmo?! – e ficou parada, tensa, enquanto a Tia Maroca baforava com vontade na sua cara e ao seu redor uma fétida fumaça de charuto de septuagésima categoria. A garota só pensava que logo, logo acabaria e brevemente aquela humilhação toda se pagaria. Ela saberia até quantos milhões teria na sua conta bancária conjunta com seu marido velho e multimilionário. Foi quando ouviu:

– Pronto, “fia”. Pode ir.
– Ir para onde?
– Ir… pode ir. Você já tá benzida e protegida, “fia”. São “vinte e cinco real” pra benzer, certo?
– Certo…

E para quem gostava sempre do certo, teve o que merecia. Pagou a grana e saiu de lá atrasada para a faculdade. No caminho, duas motos a perseguem e depois desse sarro que os orixás e oxalás tiraram com ela – ou ela mesma tirou consigo indo atrás do que vem a nós por seus próprios meios -, pensou que só podia ser assalto. Pisou fundo no acelerador e foi embora, furando o sinal que estava tão ou menos vermelho que sua cara de ódio da vidência e de si mesma.

Ela só não contava com que as motos fossem dois guardinhas de trânsito que a pediam para parar o carro. Foi nesse momento de “grande percepção” que resolveu fazer o que os ditos cujos pediam e pensou em rezar para alguém que inspirasse maior confiança do que búzios ou cachaça , mas não teve coragem.

Seria demais pedir a Nossa Senhora ou para alguma santa que a protegesse enquanto ainda estava impregnada com aquele odor de terreiro de macumba. Mesmo assim rezou: pediu com bastante veemência e resignação que, de alguma forma, os guardas de trânsito tivessem problemas de olfato e não sentissem a extravagante essência de caninha barata. Funcionou e bem melhor que seus neurônios, pelo jeito.

A partir daí, ela nunca mais procurou saber o que vai ter para o jantar ainda na hora do almoço. Decidiu pintar seu cabelo de outra cor e o cortou, temendo algum dia na vida ser reconhecida por qualquer pessoa que a tivesse encontrado no dia das tais missões adivinhatórias. Jogou fora as roupas que usou no fatídico dia e comprou um banho de ervas o qual disseram que é ótimo para tirar urucubaca de olho gordo. Como se pode ver, a menina operou grandessíssimas mudanças em sua vida.

Só não muda uma coisa: todo final de tarde, a bela garotinha de mais de vinte anos de idade se senta à janela na esperança de que apareça uma fada madrinha e a leve para fazer compras no shopping center mais “bombado” da cidade. Assim ela poderá jogar suas tranças e esperar seu príncipe encantado de idade avançada e um dote bem dotado resgata-la do caritó.

Ela senta à janela e espera… e continua esperando… pelo futuro.

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Dedicado a R. Cal

Melhor do que fazer amigos é redescobri-los. É um bônus, uma vantagem ou qualquer adicional que uma amizade pode ter. É uma delícia reencontrar um velho amigo e perceber que o tempo só passou do lado de fora, que dentro tudo continua do mesmo jeito entre vocês.

Quantos acontecimentos cabem entre uma amizade? Quantas coisas ruins ou boas conseguem f65440a85c479a8c98e372bcbe3350561c7535bb_m1caber no espaço que há entre a amizade de duas pessoas? Só é possível mensurar isso com afeto. Não que haja necessariamente um termômetro ou uma forma qualquer de medir o quanto esse sentimento é profundo ou verdadeiro.

O passar dos anos planta na mente a percepção de que amizade mesmo, amor mesmo, não é se encontrar todo dia com um amigo ou fazer imensas declarações públicas de afeto para um namorado. O bem-querer, assim como as demais coisas boas da vida, se constitui em pequenas coisas e assim transforma-se em cumplicidade.

E é aí que é uma maravilha maior redescobrir um amigo. Melhor que comer um bom bolo de chocolate é poder enchê-lo de cobertura. Melhor que fumar um cigarro é fumar um cigarro tomando um cafezinho. Melhor que ter um amigo é ter um velho amigo e reencontrá-lo depois de muitas mudanças na vida de ambos e sentar para conversar com ele como se o tempo não tivesse passado. Não! Corrijo! Não como se o tempo não tivesse passado, pois passou e da forma mais maravilhosa que poderia ser, mas como se rapidamente a gente desse um jeito de aparar as arestas que surgiram pela distância física e num estalar de dedos, a gente conseguisse conversar, rir, brincar, falar besteira e relembrar (muito).

Amigo velho, velho amigo ou velho e amigo. Sim. O tempo passou pra gente e quem nos vê brincando e rindo, numa mesa de bar que seja, nem sabe quantas conversas pela janela tivemos, as brigas de desligar telefone na cara, as paqueras, as confissões e nem faz idéia de que somos, nós dois, do tempo das cartinhas. Eu as fazia para ti em papel de carta, com envelope combinando e tudo mais.

És minha antiguidade, uma relíquia, um abajur em estilo art noveau. Num canto de uma loja de artigos usados, esse objeto pode estar meio empoeirado e até parece ter caído no esquecimento. Mas só quem o doou sabe o valor sentimental daquele objeto. No meio de tantos amigos novos, de tanta coisa nem tão nova assim na verdade, posso estar distante, podes estar tão distante quanto eu também. Mas há tanto sentimento por trás disso. Posso te chamar de amigo, e dizer que és meu. Meu amigo. Relíquia de amizade. Antiguidade no meu coração.

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Ela abriu o jornal para ler enquanto tomava café. Nada demais: notícias sobre economia, doenças, desgraças, guerras, televisão e moda. Realmente, nada de novo no mundo. Desde que seu filho saíra de casa, Beatriz mantinha uma rotina quase que religiosa: caminhada pela manhã cedo enquanto o dia ainda clareava. Depois, ler jornal e tomar o café preto, sem açúcar. Ia ao trabalho e voltava de lá direto para casa. Pelo menos três ou quatro vezes na semana fazia algo diferente: ia ao cinema numa sessão bem tarde e bem vazia ou lia para idosos num asilo. Ao contrário dos demais, não tinha medo de envelhecer. A idéia de ficar mais velha era confortável. Talvez por isso convivesse tão bem com sua solidão. a9e40c148b0f6505d8f332497a578d3068ff7826_m

Já com seus cinqüenta e três anos ela ainda podia ser considerada uma mulher bonita, mantinha o andar de mulher esguia da juventude e o olhar altivo, mas sem nem um terço do brilho e da força imperativa que tivera há bastantes anos atrás, talvez mais de 20 ou quiçá uns 30 anos. Os cabelos já brancos a obrigavam a gastar tempo no salão de beleza, o que a deixava extremamente irritada, pois a fazia sair daquela rotina totalmente programada para manter-se sob nenhuma perspectiva de risco ou de surpresa, seja ela boa ou ruim.

Foi passando os olhos pelo jornal, como de costume, que viu aquele aviso fúnebre. Precisou ajeitar os óculos empurrando com o dedo indicativo para perto do rosto. Abriu o jornal na mesa e o esticou, como se o fato de passar a palma da mão em cima daquele pedaço de desgraça em preto e branco fosse apagá-lo. Beatriz lia e relia. Voltava a vista cansada para o aviso fúnebre dele.

Ela o conheceu quando tinha 18 anos e entre as festas de rock, bebedeira e tatuagem, o flerte virou romance. E com o tempo, o tempo certo de 10 anos, o que havia entre eles virou o maior amor que ambos tiveram e eis que aprenderam a mudar o sentimento para poder adaptá-lo e não deixar morrer. Ela sentiu uma lágrima escorrer em seu rosto cansado e era uma lágrima sofrida, daquelas que dói na alma.

Morre, aos sessenta anos, Rafael. Morre, aos sessenta anos – novo, muito novo ainda, alguns exclamariam – João Rafael Albuquerque. Ele faleceu às 9 horas da manhã do dia 22 de julho. Morreu de câncer.

– Antes câncer no pulmão do que na alma – diz Beatriz no seu velho hábito de procurar glória (ou indiferença) em meio à dor.

Sua atitude foi procurar a velha caixa de presentes que guardava toda a memória de toda uma vida. Eram as cartas, as fotos, os tickets de cinema, as contas de motel e a camisa dele. Era muita, muita coisa guardada mais na pele do que na simples caixa já envelhecida. Beatriz foi tirando um por um dos papéis e se negou a chorar. Ele não aceitaria que ela chorasse, de jeito nenhum.

Rafael era Dj de rock nas festas de garagem, nos áureos tempos das bandas alternativas. Eles se conheceram assim, em meio à noite e às falsas impressões que a vida noturna regtistra. Beatriz chamava atenção porque era alta, magra e apaixonada por um amigo dele. Ele não chamava atenção dela: era um tipo comum, quase que ordinário Ele namorava há muito tempo uma menina super careta e ele em si era meio quadradão. Gente boa, mas caretão.

Ela no auge dos seus 18 anos, caloura na universidade e recém terminada de um namoro longo, queria mais era curtir e foi por isso e talvez só por isso, que acabou beijando Rafael pela primeira vez. Foi mais para irritar o amigo dele, mais para aproveitar o impulso que a vodca causava. Mas o beijo bateu, deu liga, deu calor e foi assim que começou uma história que terminaria ali, em meio a lágrimas e uma caixa cheia de lembranças.

O romance deles correu como a maior parte dos amores mal-sucedidos, mais desencontro do que encontros. Eles viveram a intensidade da paixão por um ano, se vendo quase todo dia, enquanto ele ainda namorava. E ela foi querendo mais e mais, foi escrevendo a próprio punho cartas e cartas com promessas e dizendo que acreditava muito no mais no sentimento do que na necessidade de compromisso. Até sentir o vazio, a sensação de estar apenas tapando um buraco que outra pessoa causava no coração de Rafael. Era uma solidão profunda, algo parecido com querê-lo mais ou querer mais de toda intimidade que tinham.

Então ele tentava explicar que não tinha como terminar aquela relação de tantos e tantos anos com a outra, enquanto Beatriz seguia a vida beijando e se entregando as paixões momentâneas, sempre com intuito de instigá-lo e provar a ele que um dia, ele a perderia. Mas não adiantava, em meio às pessoas que atravessavam a vida dela, ela continuava a se entregar a ele de corpo e alma.

Eis que então ela cansou. Conheceu outro cara, namorou e fingia para si que o tinha esquecido e engravidou aos 20 anos. Por conseqüência, casou. O tal namoro de Rafael acabou, sem mais, nem menos. Ela sofreu e chorou sozinha em seu quarto, amaldiçoando a si mesma por ter um dia acreditado nele. Ele conseguia sofrer de uma forma mais dolorosa porque não admitia o sofrimento, não deixava sequer que um músculo de seu rosto se movimentasse de forma a demonstrar a quem ia lhe contar que ela estava grávida do namorado que ele queria saber como ela estava. Ambos abafavam e engoliam a seco a dor.

Nessa época, ele já não era mais o Dj de festa de garagem. Era o próprio dono de seu bar de rock, que todas as amigas dela freqüentavam porque era, enfim, o mais legal dos locais para malucos e alternativos. Mais uma vez, ela se via sozinha com um sentimento ruim: era da boca dessas amigas que ela ficava sabendo das festinhas particulares dadas a portas fechadas do tal bar.

Cruzaram-se uma vez, uma única vez, enquanto ela estava grávida e apenas se olharam porque só olhar bastava. Beatriz conseguia acreditar naquele olhar como acredita em Deus, em anjos, em Karma, em coisas do destino, porque durante muito tempo ela acreditou que ele seria o seu próprio destino, o caminho trilhado para felicidade.

Ficaram um bom tempo sem se ver. E quando se encontraram de novo, parecia que nada havia mudado, era o mesmo olhar, o mesmo carinho e tudo diferente. As dores passadas foram supostamente trancadas a sete chaves em qualquer canto longínquo. Voltaram a se ver, se desejar, se amar, porém dessa vez sem nem se tocar. Eram as palavras trocadas, o tanto de vida vivido e as novidades que queriam relatar um ao outro em tão pouco tempo que causavam o frisson desse reencontro.

Caminharam por entre encontros e desencontros o resto da vida, ele perto e ela longe. Ou ela aqui e ele lá. Alguém a mais ou alguém a menos na relação. Pouco importava. Ele era o único que a fazia derreter num sorriso e falavam um parta o outro um “eu te amo” tão gostoso que era de suspirar e de fazer com que todos os poucos que sabiam que isso perdurava até então se perguntarem qual era o porquê deles não estarem juntos de verdade.

Hoje, Beatriz tinha que encarar a morte de Rafael e não se sentia mais com idade de chorar por amor. Esse sentimento a tinha consumido a vida toda até deixá-la ressequida e amarga. Ela procurava naquela caixa a carta que tinha feito para Rafael antes dele partir para um outro país, para a primeira grande despedida que ambos sabiam que seria definitiva. Ela guardava uma cópia de cada carta entregue a ele porque dentro de si, era muito mais gostoso sentir algo próximo do que já sentira do esperar que esse mesmo sentimento fosse retribuído. Durante todos esses anos, não se preocupou com reciprocidade. Somente queria dar a ele o que tinha de melhor em si e sentia orgulho de si mesma por ter sido dona de um amor tão altruísta, tão puro.

Numa folha de papel de caderno, estavam escritas as dores e o amor de Beatriz:

“Rafael,

Os dias que eu sabia que estavas lá eram os mais felizes. Nem sei o que foi que me fez ligar para tua casa, do nada, depois de não sei, mais ou menos dois anos sem te ver. Talvez seja porque nunca existiu isso entre a gente. Tempo. É, não tínhamos noção nenhuma do que era tempo. Nem ruim, nem triste, muito menos para falsas paixões. Era tudo tão verdadeiro e intenso no nosso mundo.

Pouco me importava onde era e se era na beira daquela praia de rio, pisando na areia, bebendo vodca em plena quarta-feira. O despertador, a dor de cabeça no dia seguinte, os meus planos de vida eu deixava para outra hora. Queria mais era que o tempo parasse.

Eu acho que sei o porquê d’eu te amar tanto assim, tão acima de qualquer coisa. Deve ser porque eu tinha 18 anos quando te conheci e eu nem te dava bola, mas ainda assim via teus olhos brilharem quando eu entrava nas festas. E porque me enxergavas quase tirando a minha roupa e eras proibido, eras aquele que as amigas diziam para me afastar.

Mas eu nunca ouvi demais o que os outros falavam, afinal eles eram só os outros e não sabiam de nada. Pelo menos, não mais do que eu que ficava horas e horas e horas de madrugada ao telefone, quase querendo transpor a barreira do som e atravessar, fazer o caminho contrário que fazia a tua voz só para te abraçar, te beijar e dormir naquele frio do teu quarto, com a camisa listrada que dizias ser o meu pijama.

Talvez eu te ame tanto por causa do rock. Porque ia para aquela festa de garagem te ouvir tocar e eu fingia que nem sabia que estarias lá. Era um ritual: roupa nova, maquiagem, frio na espinha, borboletas no estômago e mais três amigas. Tudo isso para compor o meu ar blasé de “eu não pertenço a você”.

Foi assim que fui tua durante todos esses anos, quase dez. Entre idas e vindas, sempre estivestes ali, no teu canto e eu cá no meu. Hoje, eu tenho mais medo de te perder porque sei que vais embora. Qualquer dia desses, não sei qual. Nem vou querer saber. Não vou saber me despedir de ti.

Antes de ires embora, quero te contar uma coisa. Um dia me disseste para ficarmos juntos. Eu fiz cara de boba e disse que sim. Achaste naquele momento que eu não entendia o que tu querias dizer e repetiste terminando a frase com a expressão:”… mas agora, de verdade!”. Eu ri, virei para o lado e dormi.

Meu presente de despedida será te contar que nesse dia eu dormi com a sensação de já estar sonhando. Ouvi de ti exatamente o que queria e sabia que aquilo não podia ser verdade, não tinha como. Eu nunca seria tua e tu nunca serás meu. Sabemos que não somos pertences.

Porque nos amamos o mesmo tanto que já nos machucamos e eu ainda te amo. Um amor tão inexplicável, tão descabido que não tem como dar certo porque de ti eu aceitaria tudo e tu pouco te importarias com meus problemas, minhas crises ou minha histeria.

Eu ficaria rouca de tanto gritar que te amo, mesmo quando estivesses ao meu lado e tu serias um canalha tão verdadeiro que me olharias nos olhos, pegarias no meu cabelo pela nuca e dirias que me amas, mesmo depois de ter beijado outra boca. Olhar-me-ias e me desejarias assim como quando eu tinha 18 anos e assim seria. Uma história com final de feliz de um casal feito um para outro. O problema é que isso não existe.

O maior bem que posso te dar é esse. É saber – e só eu saber de tudo e mais um pouco de ti – que és livre, porque também o sou. Então, fica selado o pacto que fizemos naquele final de tarde, que seremos sempre assim, um do outro. Sem porquês, sem passados, sem histórias e desencontros.

Um dia seremos um do outro e assim foi combinado, que seria na nossa velhice. Só para escandalizarmos os que souberam de toda história e quando nos olharem na rua, os jovens, não acreditarão que ali houve loucura e brigas de amor.

Ninguém acreditará que por baixo da minha roupinha florida de senhora houve uma roqueira destemida, cheia de tatuagens e piercings correndo atrás de ti nas festas de rock. E tampouco acreditarão que eras roqueiro, sedutor e mulherengo.

Afirmaremos o nosso segredo de que os amores eternos são sempre aqueles impossíveis porque se alimentam somente de sentimento. Sem falsas esperanças. Te quero como te quis a uns anos atrás. Te quero não para ser só meu, mas porque és único e eu sinto que mesmo não sendo um bem material, eu pertenço a ti. És, desde então até minha partida, meu único grande amor.

Agora, podes partir…

Beatriz”

Agora sim, ela chorava. O filho fora de casa e um ex-marido frustrado que a considerava uma megera eram suas únicas referências. O emprego que servia mais para ocupar o tempo do que para encantar a mente era sua única utilidade atualmente. Chorou porque sua pele estava enrugada e porque queria ouvir aqueles rocks, beber daquele jeito e queria muito parar de chorar. Continuava a chorar porque queria ver Rafael, queria dizer na cara dele que ele a traíra, que ousara descumprir o pacto de envelhecerem juntos, de fazer do que é por deveras vezes a pior fase da vida de muitos a melhor época da vida dela porque eles estariam juntos e assim permaneceriam. Era esse o trato.

Beatriz olhava para o jornal e não acreditava que via sua última esperança de viver um resquício de felicidade, impresso num jornal em papel vagabundo. Tudo muito preto e branco. Sentiu-se entorpecida e resolveu beber um copo de uísque e um analgésico para aliviar a dor de cabeça. Um não, três. Talvez quatro, para dormir um pouco. Melhor cinco para acordar só amanhã.

Dois dias depois, o filho de Beatriz encontrava um bilhete escrito em cima de um aviso fúnebre no jornal de alguns dias antes:

“Tua partida foi a minha maior dor. Meu único alento é poder partir também”.

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Quem não tem namorado é alguém que tirou férias não remuneradas de si mesmo, disse Arnaldo Jabor. Será mesmo? Ao ler por o texto “Namorado: ter ou não ter”, de onde retirei esse trecho, tudo parece muito lindo. Palavras como quindim, nuvem, música passeiam com displicência e fazem os solteiros pensarem em que merda é a vida sem ninguém.

Como faço parte da categoria dos solteiros não-amargurados, me senti impelida a protestar tal afirmação. Creio no seguinte: quem tem namorado, não consegue tirar férias. Nem dele, nem para si mesmo.

Quem tem namorado não viaja sem seu bem ou, se viaja não se sente completo. O amor tem dessas coisas. Quem namora perde o encanto de ir ao cinema sozinho, naquela última sessão de segunda-feira (a melhor do mundo para quem odeia falatório durante o filme). Um casal são duas pessoas, logo tudo que você faz enquanto membro dessa dupla há de ser calculado por dois.

Ora, porra. É bom pensar em si, é muito bom ter metas e calculá-las de acordo com sua vontade, com os seus planos. Solidão? Sim, ela existe e reafirma-se sempre. Mas também serve para auto-conhecimento.

É na solidão que a gente se conhece de verdade, porque namorar faz com que a gente desaprenda um pouco a olhar para dentro, já que olhar para o outro dá aquele friozinho gostoso na barriga; ao contrário de olhar para si que algumas vezes dá angústia.

Eu tive namoros longos desde nova, por volta dos 13/14 anos. Um ano, Um ano e alguns meses, três anos. Foram eles que me ensinaram a namorar, que me deram belos exemplos de confiança, carinho, respeito e amizade. Aprendi muito ao compartilhar a minha vida com eles e creio que a recíproca seja verdadeira.

Alguns me deram umas desilusões, outros deram pedacinhos de si que me marcaram e marcam até hoje, como poesias, cartas, flores, passeios. Deles eu também suguei os gostos, as gírias, os trejeitos. Aprendi a gostar de rock com meu primeiro namorado. Que sorte que ele existiu na minha vida, hein?

Ainda assim, me identifico melhor comigo mesma sendo solteira hoje, porque eu já tenho que pensar por dois e planejar por dois. Porém, é uma relação que eu tenho certeza absoluta que é para vida toda: eu e meu filho.

Acho que de tanto me adaptar a solidão, de tanto curti-la, de tanto apreciar o livre ir e vir, desaprendi a namorar. É, isso mesmo. Quando falo isso para as pessoas, ouço sempre uma risadinha de deboche. Por que é tão difícil entender isso? Sim, eu desaprendi, desacostumei… enfim, não sei qual o verbo que devo utilizar, mas é assim mesmo. Eu não sei mais.

Pelo menos, não consegui até agora passar daquela fase do início da relação, aquela que a gente tenta “ser melhor”, que quer estar sempre linda, sempre de bom humor, sempre disposta. É exatamente por isso digo que desaprendi a namorar, a repartir vida e viver o tempo todo.

Eu ainda prefiro que a pessoa saiba desde o início que eu acordo de mau humor e que ainda fico mais intragável se estou com sono. Quero alguém que me leia sem que eu precise explicar muito e se ainda assim for necessário, que me ouça com atenção porque eu odeio repetir. Que seja sociável na medida certa e que principalmente saiba calar. Bem, como ainda não apareceu ninguém assim, continuarei a curtir a minha inesgotável solteirice.

Não sei mais fazer “joguinhos”, fazer “tipinho” para agradar. Não consigo me controlar e fingir que não estou a fim de beijar ou ficar junto se é essa a minha vontade. Não quero reprimir meus desejos para fazer tipo de quem não está nem aí. Se for para ser que seja inteiro, que seja por completo. Senão, prefiro a solidão mesmo. Ela já me é conhecida e bem confortável.

A declaração de amor mais bonita que já vi foi do personagem do John Cusak para sua amada, no filme Alta Fidelidade. Não vou lembrar direitinho o diálogo, mas trata-se dele explicando para namorada, antes de pedi-la em casamento, que ele se sente atraído por uma jornalista que é  sua fã  desde que ele era Dj. Ele assume a vontade de levá-la para cama por conta de um desejo quase incontrolável, algo bem carnal.cusack

Ao mesmo tempo em que se sente assim, ele pensa na namorada. Pensa nela com maturidade regada a eternidade. Imagina ambos lendo jornal num domingo, lembra das calcinhas comuns que ela usa , enquanto ele sabe da existência das lingeries melhores. E é então que ele vê que isso sim é amor.É aí que ele vê a diferença entre o desejo carnal e o amor. O amor é realidade, é dia-a-dia e não, nem sempre é belo como  lingeries rendadas que são usadas somente para fisgar. Porque o desejo carnal passa, mas confiança, carinho, companheirismo, amor de verdade, não.

Não quero ter que me camuflar, nem quero alguém que não seja o que é por inteiro. O sentimento que mais me apetece é sinceridade. No amor, na cama e nos olhos de quem eu quero. E se assim for do desejo dele, que me aceite com sinceridade também e que tenha muita paixão pela vida.

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